Na senda das tertúlias de antigamente, estes serão encontros informais, para conversarmos sobre livros e leituras, para lermos em voz alta, para ligarmos a literatura a outras artes. Enfim, para partilharmos emoções, palavras, experiências.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Resumo do último encontro

Na passada quarta-feira não falámos só de Abraço. Como é habitual nos nossos encontros, o livro escolhido leva a outras leituras e este não foi exceção. Falámos também de Morreste-me, LivroHoje Não, Cemitério de Pianos, Cal, A Criança em Ruínas, todos de José Luís Peixoto.

Porém, não ficámos por aqui! Ainda houve tempo para conversarmos brevemente sobre: Contos de São Petersburgo, de Nikolai Gógol, Os Pilares da Terra, de Ken Follett, 2666, de Roberto Bolaño e Parábola do Cágado Velho, de Pepetela.


O nosso próximo encontro será a 23 de maio e falaremos de Afirma Pereira, de Antonio Tabucchi, grande escritor italiano (mas também português) falecido no mês passado.

                                       

1 comentário:

Anónimo disse...

Descobri este pequeno resumo, de Rita Pimenta, no Guia de Leitura da coleção Mil folhas do Público.


Antonio Tabucchi
Afirma Pereira
O tormento de mudar

Retrato do ambiente europeu no final dos anos 30, Afirma Pereira tem como pano de fundo o salazarismo, o fascismo italiano e a guerra civil espanhola. Em Lisboa, um solitário jornalista, resignado sem opções políticas, consegue mudar a sua atitude perante o mundo. E conta-nos como Pereira torna-se responsável pela página cultural do diário vespertino Lisboa. É Verão e o calendário marca o ano de 1938. O velho jornalista chama a si a tarefa de escrever a biografia de escritores famosos, para que no momento da sua morte não seja apanhado desprevenido.
E assim transforma a gaveta da sua secretária na Rodrigo da Fonseca numa espécie de pré-jazigo de autores a enterrar.
É precisamente de uma reflexão sobre a morte que o livro parte e é esta que motiva o encontro do protagonista com Francisco Monteiro Rossi, o principal catalisador da mudança do jornalista que bebe limonadas.
Contratado para o ajudar na necrologia dos escritores, Rossi sempre apresenta textos impublicáveis, carregados que estão de ideologia contracorrente, como aquele em que idolatra o revolucionário Maiakowski.
Sem compreender exatamente porquê, Pereira mantém este colaborador a expensas suas, não participando ao diretor do Lisboa, que é simpatizante do regime.
Monteiro Rossi acaba por confessar ao jornalista que sem Marta, a sua namorada, nunca conseguiria escrever sobre a morte, que associa ao fascismo: "Sabe o que gritam os nacionalistas espanhóis? Gritam “viva la muerte”, e eu não sei escrever sobre a morte, eu gosto é da vida, doutor Pereira, e só por mim não teria sido capaz de escrever necrológios, de falar da morte, creia-me, não sou capaz de falar da morte".
Marta e Rossi estão ligados às brigadas internacionais que combatem em Espanha do lado dos republicanos e foram encarregados de recrutar voluntários no Alentejo.
Ao identificar-se com estes jovens e ao ajudá-los, o viúvo Pereira vai reconsiderando a sua existência e vive o tormento próprio de quem sente um apelo de mudança. Uma inexplicável sensação de arrependimento já o havia assaltado: “Observava as estrias de luz e de sombra das persianas no teto, pensava em Hongrine de Balzac, no arrependimento, e parecia-lhe que também ele devia arrepender-se de alguma coisa, mas não sabia de quê”.
Pereira vê-se então arrastado para a luta antifascista, para o que também contribuíram as conversas com o padre António, que o informa do apoio que a Igreja Católica dá a Franco. A notícia de que Claudel defende os criminosos, levando o padre a chamar-lhe “filho da puta”, inquieta igualmente Pereira, que se mostra impressionado com a coragem do católico Bernanos em denunciar os crimes do franquismo na guerra civil de Espanha.
Uma vez desperto para o mundo, Pereira vai questionando de forma ainda mais aguda o seu passado. E dá-se conta de que já não fala com o retrato da mulher.
O doutor Cardoso, defensor da tese dos múltiplos eus em cada um de nós, cujo comando se alterna entre eles, convence Pereira de que o seu eu hegemónico atual é mais decidido e corajoso.
Será o trágico desfecho para Monteiro Rossi que dará o impulso final para a transformação de Pereira, que resolve denunciar as práticas violentas e ilícitas da polícia política: “Ontem à noite, quando jantava em casa do diretor da página cultural do Lisboa, o doutor Pereira, que escreve este artigo, três homens armados irromperam pela casa dentro. Declararam pertencer à polícia política, mas não mostraram nenhum documento que o confirmasse. Inclinamo-nos a excluir a possibilidade de se tratar realmente da polícia, pois estavam à paisana e porque acreditamos que a polícia do nosso país não use tais métodos. Eram verdadeiros facínoras, que atuavam com cumplicidades que desconhecemos, e seria bom que as autoridades indagassem sobre este ignóbil acontecimento”, afirma Pereira. Um bom romance, afirmamos nós.